segunda-feira, 31 de agosto de 2015





                                             MOMENTOS


                   Sixia, a chinezinha foi embora. Terminaram seus seis meses. Se eu tivesse ficado aqui desde março, estaria indo embora também. Como naquela turma só havia tres alunas, e duas foram embora, Sixia ficou sozinha. Primeiro integrou uma turma de vincentianos, que fizeram o curso de um mês. Depois, passou a fazer parte do grupo dos doze meses, que já estava no final. Quando o grupo dos doze meses acabou, Sixia trocou de grupo novamente. E finalmente, começou o nosso grupo de seis meses e ela se uniu a nós. Então, passou por todos os grupos.
                  Era querida de todos. E eu me espantei de ver o quanto tinha crescido e amadurecido durante esse tempo em que fiquei em São Paulo. Ela que quase não falava, era toda tímida, toda encabulada, não tinha muitas opiniões sobre as coisas, estava super falante, cheia de idéias, cheia de opiniões,  querida de todos. Uma mudança impressionante.
                  Em março, ela não sabia nadar, não tinha coragem de tirar a roupa! Entrava no mar de bermuda e top de ginástica, mesmo com o maiô por baixo. Dizia que na China, ficar bronzeada é feio e que as chinesas se banham de roupa pra não tomar sol.
                  Agora,  usa um biquini bem pequenininho e está toda moreninha. Aprendeu a nadar e teve coragem de pular do penhasco de cinco metros. Ainda tinha medo de pular dos sete metros.
                  Combinei de pular junto com ela dos sete metros. De mãos dadas. Subimos o penhasco, olhamos a água azul, lá em baixo... nos demos as mãos, não pensamos muito, contamos um, dois tres... e pulamos.
                 As mãos se soltaram logo, mas  o importante era ter a coragem de pular! E ela teve! Venceu o medo! Ela teria vencido de qualquer maneira, mas foi muito bom ter participado desse momento!
                Um pescador filmou pra nós.  Uma bela lembrança.

                                                                   ***

                  Ontem foi noite de lua cheia! Lua enorme, lindíssima prateando o mar do Caribe.
                  Durante toda a tarde, houve um movimento incomum na cozinha. Era a preparação de "snacks" (petiscos), para um piquenique noturno. Tivemos petiscos chilenos, colombianos,  um biscoito feito pelo indiano, pipoca e limonada. O professor vegano e o inglês foram antes, para acender uma fogueira. Nós fomos depois, sem usar lanternas, só com a luz da lua, carregando as vasilhas com as comidas. Chegamos na praia e a fogueira já estava acesa. Deixamos a comida perto do fogo e fomos nadar...
                   Delícia! Delícia! Delícia! A água às vezes morna, às vezes gelada, A lua enorme. Quando passava uma núvem, e a lua escurecia, ficavámos procurando planctuns...  Abençoado mar do Caribe, abençoada lua, estrelas, amigos, fogueira... tudo!
                   Saímos da água e nos sentamos em volta da fogueira, enquanto comíamos os petiscos. O professor venezuelano e sua namorada sueca tocaram violão e cantaram.  Quando sabíamos as canções, cantávamos junto. Tudo perfeito!

                                                                   ***

                   Todos os alunos tem um projeto. As colombianas tem um filtro para purificação de águas servidas. O indiano tem um projeto de mapear o pomar e colocar placas em cada árvore explicando suas qualidades.  Nadhia e eu temos um projeto de fazer sabão orgânico.
                  Para fazer o sabão, primeiro pesquisamos receitas caseiras no Google, pedimos a parentes que nos enviem receitas, já fomos duas vezes a Kingstown, comprar produtos e falar com pessoas. Enfrentamos todo o calor e confusão da cidade, Suamos por todos os poros,
                 Fizemos tres experiências, em vão. Estávamos quase desistindo, quando nosso professor pesquisou em inglês, no Google e nos trouxe uma receita nova de sabão em barra. E nós, por nossa conta, achamos outra receita de sabão líquido. Fizemos as duas, quase na base do olhômetro. E... não é que parece que vai dar certo? Fizemos os dois, agora eles tem de descansar e depois vamos finalizar.
                   Estamos esperançosas.

                                                                    ***                                                            

                    Gringos comem de boca aberta. Falam de boca cheia. Pegam a comida com as mãos e depois lambem todos os dedos. Afe!
                     Sei que não devia generalizar, mas latino americanos e vincentianos (pelo menos os que estão aqui), são muito mais bem educados.
                     A cozinheira que faz todas as comidas, traz marmita de casa.
                     A gente janta às seis da tarde. Ainda está claro. Às  oito da noite, temos a impressão de que são onze. Às onze, parece duas horas da manhã. Que coisa!
                     Como faz calor! Eu durmo às nove horas da noite, acabo acordando às quatro e meia... mesmo nessa hora, tenho que manter o ventilador ligado... as poucas vezes que desliguei, o quarto virou um forno!


                      Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                              Eulina

domingo, 23 de agosto de 2015





                                                    ONTEM


                   Foi o dia mais aventuroso de todos!
                   Começou normalmente, com a tarefa minha e de Nadhia, de ir até Kingstown para entrevistar a fabricante de sabão orgânico e pedir que ela nos ensine a fabricar um detergente orgânico.
                    Outros estudantes tinham outras tarefas. Eramos seis no carro da RVA. Solão. Calor de rachar os miolos. Já chegamos cansados. Perguntei várias vezes onde e a que horas o motorista viria nos pegar. Ele não respondia, fingia que não entendia. Outros perguntaram a mesma coisa. Nada. Ele não colaborava. Ficamos vagamente combinados de nos encontrar às duas horas da tarde no mesmo lugar onde ele nos deixou.
                     Partimos para as nossas diferentes tarefas.A cidade parece um caldeirão do diabo! Nossas roupas ficam logo molhadas de suor. Entrevistamos a fabricante do  sabão e começamos a comprar as coisas da lista que trouxemos. Alguma lojas tem ar condicionado.  Numa delas, Nadhia está comprando chocolate, quando um senhor se aproxima. De onde voce é, o que está fazendo aqui em St. Vincent, onde voce está hospedada? Nadhia vai respondendo, meio encabulada com o sucesso que faz uma loira num mundo de negros, mas sempre com um sorriso, que é sua cativante maneira de encarar o mundo. Ele se afasta por um instante e logo em seguida, uma senhora vem atrás e fala para Nadhia:
                     - He is the Prime Minister!
                     - Eu chego nessa hora e Nádhia arregala seus grandes olhos e me pergunta em português;
                     - Lina o que é Prime Minister? - eu começo a explicar, quando ele volta:
                     - My princess, is this your mammy?  - Both from Brazil? I know your president, I am friend of  Dilma and  Lula! - explico que somos apenas amigas e ele continua olhando intensamente para Nadhia, dá um cartão pra ela, dizendo:
                     - Call me! Anything you want, you can call me at this number - escreve um número no verso do cartão - This is my private number call me I will answer myself, call me... e o papo iria continuar, mas chegou uma outra mulher de salto alto, vestido bem justo e peruca loira, e ele virou-se pra ela:
                     - My princess! - e continuou a conversa com ela.
                      Quantas princesas será que ele tem? Nadhia e eu saimos de perto. Observo que não houve nenhuma alteração no funcionamento da loja. As pessoas não parecem alvoroçadas com a presença do Prime Minister. Parece que ele tinha apenas uma assessora e um guarda costas. A senhora que nos contou que ele é o ministro e o negão enorme que forneceu o cartão pra ele.
                      Acabamos as compras e vamos embora, nos sentindo muito importantes, por ter o telefone privado do Primeiro Ministro!
                                                                  ***
                      Fomos almoçar e depois nos encontrar com nossos colegas para tomar o carro de volta. Péssima surpresa! O carro não estava lá. Telefonamos para o motorista. Ele disse que estava em outro lugar e que iria sair logo. Vamos andando depressa em direção ao local indicado. Um calor infernal. Estamos todos molhados, grudentos, cansados. O local que o motorista indicou é um supermercado. Tem ar condicionado. Ficamos na porta esperando.
                     Depois de algum tempo, telefonamos novamente. Ele disse que não havia lugar no carro então ele foi embora. E nem nos avisou! Que fazer? Resolver todas essas questões toma tempo! Tem o barulho das ruas, tem o sol, tem a dificuldade das línguas, dos sotaques... afinal éramos um inglês, uma chilena, uma eslovaca, uma dinamarquesa e duas brasileiras, todos suados e indignados,  Até chegar a uma conclusão, demorou! enfim decidimos o óbvio. Temos que tomar a van. Outra caminhada até o ponto de partida das vans.No caminho, um incêndio!  Paramos um pouco, os bombeiro já haviam dominado o fogo e estavam limpando o local! Vamos indo,  carregando os pacotes das compras. Longo caminho sob o solão!  Chegamos, Na van cabem quinze pessoas. Entram deszenove. Mais os pacotes. Ai meu Deus!
                      Viemos apertados pelas curvas da estrada, grudados uns aos outros dentro da van. Numa das últimas paradas, desceu uma mulher bem gorda, com duas crianças, que eu nem tinha visto! Então não éramos desenove pessoas, eramos vinte e uma! E mais os pacotes. Muitos pacotes.
                                                               ***
                      Chegamos exaustos. Nadhia e eu vamos à praia. Delícia! Ainda bem que existe a praia, o mar azul do Caribe.
                                                               ***
                       Depois da janta, banho tomado, vem aquela vontade de uma cervejinha... só de saber que é proibida, a vontade aumenta. Combinamos com uma das colombianas. Vamos fazer uma proibidíssima excursão noturna até o boteco da praia, pra tomar uma cerveja. A chilena falou que vai mais tarde.
                      Temos que sair no escuro, para que não nos vejam.  Imaginem a cena: a colombiana de vinte e dois anos, a Nadhia com trinta e eu de setenta e dois, andando no escuro,  sem lanternas,tudo por uma cerveja! Ainda bem que temos lua.
                     Mas,ainda temos que passar no galinheiro!  A colombiana está encarregada de fechar a porta do galinheiro, mas antes precisa contar quantas galinhas estão lá para saber se alguma fugiu. Vamos com ela  rindo da situação  e ela muito engraçada, vai reclamando:
                      -  No, no, no... jo no nessecito de chickens! Jo necessito de beer, cervesa, I hate chickens, I want beer!
                      A essa altura, gargalhamos. Ela entra no galinheiro:
                      - Uno,  dos. tres... no, galinas, no... chikens I hate you ... ten, eleven... quiero cervesa... hate galinas, jo no necessito de ustedes...  trinta e uno, trinta e dos... beer... finish.  Fourty two galinas. Fuck, there must be fourty four! Fuck, fuck, galinas, I hate you!
                      Minha barriga dói de tanto rir, tal o absurdo da situação! Ela apaga a luz do galinheiro, fecha porta e prosseguimos nossa jornada, quase sufocadas de tanto rir.
                      Estamos longe, já podemos acender as lanternas. Continuamos a caminhada, vemos a lua refletindo no mar, lindo, lindo lindo... Atravessamos o gramado do campo de futebol e estamos perto do boteco. Estranho. Não há nenhum som. Só o silencio da noite. Chegamos mais perto. Decepção. Boteco fechado. No beer, no cervesa!
                     Mas a noite está linda, lua, estrelas, reflexo no mar... resolvemos deitar no gramado para olhar as estrelas. Ainda davamos risada... quando ouvimos um estampido! Ai! O que é isso! O coração bate forte! Um tiro? Levantamos e eu acendi a lanterna pra olhar o mato, não sei pra quê, pois não ia dar pra ver nada mesmo. Passados alguns minutos, nos acalmamos e deitamos novamente, ainda dando risada. De repente, Nadhia diz:
                      - Meu Deus! Vem vindo um homem! Nós olhamos e ele vinha em nossa direção, carregando um machete - ai, coração pula, bate desgovernado, que fazer? Ele chega, e começa a conversar, com a colombiana, nos convida para uma festa em Chateaubelair, diz que seus amigos tem carro e que pode nos levar, nós dizemos que estamos esperando nossos amigos e que só queremos ficar ali vendo as estrelas, Nesse momento, ele se mexe e vemos claramente!
                      Não é um machete, é um fuzil! Meu Deus! E  agora, o que fazemos?  Nessa hora, chega a chilena que vinha mais tarde, ela não desconfia dele e começa a conversar normalmente. Minha cabeça dá voltas, penso desesperadamente em como sair dali... ai meu Deus... e agora? Aí, chega o carro com os amigos dele. Ainda bem que o campo é longe da estrada, se ele quiser forçar a nossa entrada no carro, vai ser um longo percurso, da tempo de gritar, de sair correndo, de fazer alguma coisa...
                     Os amigos gritam  alguma coisa sem sair do carro. Ele deixa cair o fuzil e vai até o carro. Assim que ele se vira, nós levantamos, para espanto da chilena que tinha acabado de chegar e saimos, caminhando bem depressa. Não corremos, mas andamos o mais rápido possível.
                      He has a gun! He shouted the gun! - eu disse, enquanto a colombiana explicava em espanhol... quando chegamos na curva da estrada e começo da subida, ouvimos gritos e começamos a correr, apavoradas. ainda bem que eles estão longe, correndo dá tempo de chegar até a escola...assim vamos, até que a colombiana fala ofegante!
                   - I lost my keys! I cannot enter in my room! - Ai meu Deus, temos que pedir a chave reserva e dar explicações...  os gritos silenciaram, paramos pra pensar... descemos um pouco, procurando a chave. Ainda bem que achamos logo. Ufa! Voltamos a caminhar depressa, Eu digo:
                    - We had gone with the colombian girl to count the chickens and the night was so beautiful, that we decided to go to the football camp just to see the moon, the stars and the sea.
                    Alibi resolvido, subimos. Ainda havia gente nos terraços conversando. Ninguém perguntou nada. Aos poucos o coração foi acalmando e eu acabei participando de todo o papo psico-filosófico, que sempre acontece nas noites de luar.
                    Essa noite, não consegui dormir! Conhecer o Prime Minister, correr pelas curvas da estradas apertada dentro de uma van, com vinte e uma pessoas! Transgredir regras, contar galinhas, correr de medo, procurar a chave, combinar um álibi... nem Roberto Carlos sentiu tantas emoções assim!
                    Uma explicação: todos os homens vincentianos andam com uma faca grandona chamada machete.
                    Mais uma vez, obrigada, meu super anjo da Guarda!

                                                                      ***
                    Pra terminar, só mais esta: eu fiz geleia de carambola. Eles colocaram na mesa de jantar e eu vi alguns comendo com feijão!

                    Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                         Eulina












domingo, 16 de agosto de 2015



                                                               

                                                                 COMIDA



                    Na hora da sobremesa, um professor boliviano e vegano começa a roer o avesso da casca da banana. Olhares. Ele começa a explicar:
                    - This is very good to...
                    - This banana is not organic! - alguém avisou.
                    Ele parou  imediatamente.  Levantou-se foi até a cozinha e voltou decepcionado. Não havia mais banana orgânica. O assunto já tinha mudado e a explicação ficou esquecida. Talvez quando houver uma casca de banana orgânica...

                    Eu amasso abacate e procuro açúcar. Acabou. Vou até o meu quarto e pego o Zero Cal, já me preparando para ouvir o sermão.
                   - What is this? - pergunta uma vegana.
                   - I will not say what I think about vegan food, and you won't say what you think about my food, right?
                   Foi bom. Pudemos falar de outros assuntos.

                   As "galinhas orgânicas" estão doentes. Morreram duas. A colombiana que toma conta delas estva chorando. Aquele professore disse:
                    - That's why I am vegan! If everybody was vegan, we don't have to create chickens.
                    Meu Deus, espero que esse dia não chegue nunca!

                                                           Cardápios

                    Macarrão sem molho nenhum. Acompanha banana frita. Eles chamam de plátano, acho que no Brasil é banana de São Tomé.
                    Grão de bico cosido. Acompanha batata doce.
                    Cebola frita no café da manhã. Gostoso.
                    Salada de pepino com pimentão verde e vermelho no café da manhã. Arg!
                    Abobora fatiada assada, temperada só com canela, sem sal.
                    Arroz pode ser vermelho, com paprika, amarelo com curry, marrom, não sei com quê,                         sempre integral, unidos venceremos e sem sal.
                    Arroz branco, nem pensar.
                    Hors concours: salada de quiabo cru, com molho de pimenta.
                    Tudo sem sal. O sal grosso (sempre sal grosso) fica na mesa. Temperamos salada com      sal grosso, ovo cosido  com sal grosso, abacate com açúcar cristal. Fica tudo crocante.
                    Outro dia, teve a "Noite dos Talentos". Eu fiz espaguete à bolonhesa. Pediram a receita do espaguete. Tomara que as cozinheiras aprendam                  

                                                             Peixe

                    No domingo, os vicentianos pescam e fazem churrasco na praia. Eu estava recostada nas pedras tomando sol e observando um casal limpando os peixes que acabaram de pescar. Então chega a chinezinha bem xereta
                    - Que peixe é esse?
                    - É  lyon fish.
                    - Não é. Lyon fish tem pelos na cabeça! - ela chega mais perto.
                    - Mas estes tem pelo na cabeça, quando estão na água! Cuidado que eles são venenosos!
                    - E voces vão comer?
                    - Vamos, mas vamos tirar a cabeça, que é onde fica o veneno.
                    - Mas lyons fishes ficam no oceano, não ficam perto da praia - ela não desiste. Eu olho a cara deles. Fico com medo de  perderem a paciência,
                    - Eles vem perto da praia quando querem comer peixes pequenos.
                    - Então eles são predadores.
                    - É a natureza, Uns comem os outros. -  Eu falo. Quero acabar logo esse papo, mas nessa hora chega o professor vegano.
                    - E o homem é o maior predador que existe, bla bla bla... - Ai meu Deus, até no domingo, na praia? Só falta ele falar que os peixes devem ser veganos... O casal olha o discurso, com cara de poucos amigos:
                    - É. O homem destroi tudo!  - Diz o negão, lindão, rasta de corpo atlético e luzidio, sem sorrir. Acho que ele sabe que é lindão. Fica se mostrando. Mostra a força.
                    - Good bye! Have a nice day! - Eu pego minha canga e me levanto para ir embora, a chinezinha vem comigo, falando, falando. O professor volta pra água.
                      E na RVA, teve peixe frito no almoço. Será que eram lyon fishes?

                     Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                         Eulina

                                                                         
                   
                 
                   


                   .





                                                     

                 
                   
                   
 

terça-feira, 11 de agosto de 2015





                                                    ALGUMA COISA ERRADA...


                    Em março, quando estive aqui pela primeira vez, fui a uma reunião com a população local. O assunto era GMO Food (comida geneticamente modificada). Perguntei se a população sabia o que era. Disseram que iam explicar. Desconfiei. As explicações que ouvi aqui, são muito complicadas, será que o povo ia entender?
                    Fomos até um povoado próximo, levamos o projetor e"power point" arrumamos uma sala na escola, e ficamos esperando o povo chegar. Depois de meia hora de espera, eu perguntei a que horas tinham marcado... e me responderam que não tinham marcado! Como assim não marcaram? E como querem que o povo apareça? Disseram que o povo ia ver o movimento e entrar. Esperamos por mais meia hora. Oito pessoas viram o movimento e entraram. Cinco adultos e três crianças e um bebê, que ficou mamando durante a apresentação.
                   Então resolveram começar. Projetaram gens e fórmulas. Explicaram a mutação dos gens e contaram porque as sementes da Monsanto não se reproduzem, obrigando todos a comprarem novas sementes, toda vez que quiserem uma nova planta. Falaram que estamos todos correndo o risco de ter nossos gens modificados também. Por fim, disseram que não devemos comer as comidas vendidas em supermercados, mas sim plantar e comer a comida orgânica.
                   Olhei as pessoas. A mãe amamentava, as crianças pulavam inquietas em torno das cadeiras, acho que dois adultos prestaram atenção enquanto os outros dormiam.

                                                                   ***

                   Outro dia, era o "kid's day". Nesse dia, todos os estudantes vão a escola de Chateaubelair fazer atividades com as crianças. Muitos preparativos. Lápis de cor, papel, tesoura para recortar, bolas... e muita disposição. Brincar com crianças todos querem.
                    Mas, amanheceu chovendo. Não uma chuvinha, daquelas com arco íris que passa logo, Chuva forte, pesada que molha muito e quando para um pouco, não para de vez, sobra sempre uma garoa. Depois chove novamente.
                   Pra tudo tem reunião, então teve reunião pra discutir se vamos com chuva, ou não, já que o lugar das brincadeiras é ao ar livre. Bla, bla, bla, a maioria foi contra, mas bla.bla.bla, a escola assumiu o compromisso, vai ficar feio se ningém for, as crianças vão ficar esperando, bla bla bla, quem quer vai, quem não quer fica. Enfim. Eu fiquei. A chinesinha também. As crianças não são estúpidas, ela disse. Vão entender que as pessoas não vão por causa da chuva. Eu também acho, loucura insistir em brincadeiras ao ar livre com esta chuva!
                   Mas eles foram . Quase todos. Ficamos a chinesa, eu e mais dois alunos. Suportamos os olhares de reprovação. Fui para o meu quarto, gozar da manhã de folga, Passados uns quarenta minutos, eles voltam. As crianças não estavam lá.
                    Então, os marmanjos jogaram um pouco de voleibol na chuva e depois voltaram, desapontados. Bem que a chinesa disse: As crianças não são estúpidas.
                    Foi difícil não lançar olhares de "eu não disse?".

                                                                         ***

                   Dia primeiro de agosto, foi a festa da independência, ocasião em que é celebrada a colheita da fruta pão. Os alunos do curso de luta contra a pobreza, planejaram empoderar as mulheres que vendem algum produto de artesanato, comida, roupas, bordados, etc., então, resolveram fazer cartazes, distribuir panfletos, estimulando as compras no comércio local. Soubemos que a festa iria começar às três horas da tarde. Eu estranhei, porque é hora do maior solão. Suadouro, na certa.
                    Não havia carro para nos levar. Fomos a pé, logo depois do almoço, carregando os cartazes. Uma hora de caminhada, derretendo ao sol do Caribe. Ainda bem que a maior parte da estrada fica debaixo de árvores. Mas mesmo assim... chegamos, pouco antes das tres. No local, ninguém. Os cartazes foram pregados nas colunas e foi utilizada uma mesa para colocar os panfletos.
Ficamos aguardando as mulheres. Veio uma, que vendia shampoo e cremes industrializados. E mais tarde veio um homem, vendendo algo parecido um pastel.
                      Ficamos até às quatro e meia derretendo os miolos no sol. Nadhia e eu fomos até um boteco, tomar água gelada e encontramos uma mulher que foi cozinheira na RVA. Eu perguntei a ela sobre a festa e ela disse que talvez fosse depois das cinco horas. Eu penso com meus botões: ninguém é estúpido suficiente para marcar um evento, às três horas da tarde, debaixo de um sol de mais de quarenta graus!
                      As meninas voltaram à noite e a festa estava super animada.

                                                                   ***

                    Depois, eu encontro o homem que tem ciume e não sabe do quê e chama a montanha do vulcão de "minha montanha".
                    Eu soube de uma palestra que a diretora foi dar, em Kingstown  na qual compareceram tres vincentianos.
                    Uma das colombianas passou muito mal. O engenheiro a levou para o hospital, o professor e as outras colombianas também foram. Passamos o dia sem aula. Os diretores não tocaram no assunto, conversaram sobre amenidades na hora do almoço. Depois da janta, eu perguntei se havia notícias dela, para uma das diretoras e ela disse:
                    - Why do you ask me?
                    - Because she is very sick in a hospital!
                    - I didn't know! Nobody told me. So, ask to another person. - e continuou a escrever no computador, como se nada tivesse acontecido! Coração de pedra!

                                                                    ***
             
                     Passo a observar mais o comportamento dos vincentianos em relação a nós. Parecem sempre desconfiados.
                    Afinal, a sua história é plena de episódios em que chegaram pessoas vindas de outras terras acabaram por destruir suas tradições, seus costumes, suas religiões, sua identidade.
                    Não é uma afirmação. é ainda uma impressão, mas parece mesmo que, como dizia Shakspeare, "há. qualquer coisa de podre no reino da Dinamarca".

                   
                    Você já pode dizer eu li na tela da
                                                                         Eulina
                 


                 















quinta-feira, 6 de agosto de 2015

                                                        




                                                               TO THINK ABOUT
                                      

                      Segue a matéria que fiz para o blog da RVA.
                      O fato aconteceu no domingo passado e me fez pensar muito.
                                                                     
                                                                           ***

           Early in a rainy sunday morning, before breakfast. I went  to take a walk around the school.
         This place is really beautiful!  I went to see the baby pigs, and after took the way to the ruins, cause I wanted to take some photos.  But it sarted to rain.  At first a light rain, but it was getting heavy, so I decided  to came back.
         On the way back, there was a man on the road.  Rastafari hair, dark clothes, a bottle of beer in his hands, and a smile with only two theets, far away one of the other.  But nice!
        After good morning, greetings, he asked me:
        - Where are you from?
        - I am from Brasil.
        - Nice country.
        - Thank you.  Your country is really  beautiful!  And the people is very nice too!
       - No, not all the people is  nice!
       - Why?
       - Most part of the people is jealous.  I am jealous!
       - Jealous?!?! Jealous of what?
       - I don’t know.
      At this time, I was so curious about what he told, I wanted to ask a lot more, I wanted to understand that feeling of the people, but my poor english did not help me, I was trying to find words to continue the talk, and the words does not appear in my mind… and then he asked me: 
       - Are you in that school? – and pointed at RVA.
       - Yes. - Then he started to talk and talk, too fast for my little capacity of understanding.
       - Please, speak slowly so that I can understand you!
        And he tried to do it, but he was speaking in his way of pronunciation, and I didn’t understand too. I was thinking so hard, so many questions in my head, and the words doesn’t come… oh my God what can I do?
         – Now, I am going to my mountain! – he said clearly. Pointing at the volcano.
         – Your mountain?  That one with the volcano?
         – Yes.  My mountain.
         – Why are you going there?  - I asked and immediately regret of such a stupid question, and try to complete – It is raining so much!
       He looked in my eyes and told:
      - I am going there, because it is mine – and start to talk quickly and  with his accent again.
       At this point I had to turn to right in RVA direction. I stopped. He stopped too. Told me good bye, giving me his closed right hand in his way of doing it, I did the same, and he smiled, put his hand over his hart and said:
       - You are a nice people!
       - Have a good day in your mountain! – I answered smiling at him. Good bye!
       And I started walking faster, because the rain was getting hard, and I was already completely wet.  But my mind was full of questions.
        Who is him?  Why did he say that people of St. Vincent is not nice?  Why  are they jealous? Jealous  of what?  Why they don’t know why they are jealous?
        Later, in my room, I realized that sometimes, he talked a good English, so that I can understand, and other times, he talked quickly, and with accent, and I couldn’t understand. And immediately a new question appear in my mind:
        - What was he trying to say to me?

                                                                *****

                    Voce já pode dizer eu li na tela da 
                                                                          Eulina

       


terça-feira, 4 de agosto de 2015






                                                         COLÉGIO INTERNO



                  Estou matando aula.  Agora, estou tendo aula de horta "garden" como eles chamam. A aula começa às 8:30 e vai até 10:30. São 10 horas e eu já fiz a minha parte. Tirei matinhos do canteiro maior da "nursery". Voltei para o meu quarto. Espero que não tenha amolação por causa disso.

                                                                     ***
                    Todos tem "cleaning area".  A minha área de limpeza é um dos banheiros. Eu que escolhi, porque ninguém gosta de limpar banheiro, mas quando a gente limpa diariamente, fica fácil e é rapidinho.  Em março, eu varria o corredor, a lavanderia e o terraço. Demorava muito mais. Desta vez, fiquei com um dos banheiros e recebi elogios, porque o meu banheiro está sempre limpinho!
                     Pois bem. Uma das diretoras, a mais chata, ficou a manhã toda passando aspirador nas salas e na cozinha dos professores. Nesse mesmo dia faltou água no meu banheiro, e eu não precisei fazer a limpeza;  tive um tempo livre.  Achei ótimo. Fui beber água na cozinha dos professores e vi o teto cheio de teias de aranha, apesar da "limpeza" feita pela diretora.
                      Na hora do almoço, eu comentei que achei ótimo ter um tempo livre e a diretora disse:                       - Então voce deveria ter limpado outro lugar, afinal há tanto o que limpar! Essa não foi uma boa atitude!
                     Ai, já estou muito velha pra ouvir isso! Pensei um pouco e respondi:
                   - Da próxima vez, voce me empresta o aspirador, que eu limpo todas as teias de aranha da cozinha.
                   O sorriso dela petrificou.

                                                               ***
                    Sábado passado, houve uma festa em Chateaubelair (a cidade mais perto), Comemoração da independência e festa da fruta pão. Existem inúmeras árvores de fruta pão e estão todas carregadas! Fomos lá à tarde e não havia nem gente nem animação. Um sol de rachar os miolos. Eu voltei. Vários voltaram. O engenheiro, as colombianas e a Nadhia (a outra brasileira), resolveram ir à festa à noite. Mas isto é um colégio interno! 
                  Então, as meninas tiveram que sair escondido, e para ir até o ponto em que encontrariam o engenheiro, tiveram que cruzar o pasto, passar pelo pomar, pelos galinheiros, pelos chiqueiro, atravessar uma cerca de arame farpado,  tudo no escuro, sem ligar as lanternas, para que ninguém visse... e desviando dos sapos e das baratas, no caminho! Que aventura! Quase morri de rir, quando me contaram os detalhes!
            E à noite, a festa foi animadíssima! Elas jantaram uma boa comida, tomaram cerveja,  dançaram e rebolaram com o povo daqui... se esbaldaram. Chegaram exaustas e felizes, às duas horas da manhã.
                   No dia seguinte, muitas fofocas, muitos olhares enviezados e a recomendação de um dos professores:
                - Tomem cuidado com o que vocês fazem, porque tem gente observando tudo! 
                 Que coisa!

                                                              ***

              A janta é às seis horas. Quando acabamos de jantar, ainda está claro. Depois da janta, sempre há alguma atividade em conjunto, que vai mais ou menos até às oito horas. Só então estamos livres. 
               Mas... não há TV, nem radio, nem telefone, o sinal da internet é muito ruim.  Algumas vezes ficamos em um dos terraços conversando.  Mas acho que as pessoas tem vontade de falar a própria língua.
         Nadhia e eu fazemos a hora da fofoca, no meu quarto, enquanto comemos alguma comida secreta. Às vezes vem alguém participar da nossa fofoca. É um barato. Comentamos quem está com quem, quem come de boca aberta, quem não usa desodorante, qual a última da bruxa loira (a diretora chata), qual a aula mais chata... tudo igualzinho o que acontece nos colégios internos (pelo menos em filmes). Eu me sinto adolescente de novo!

                                                                ***

                     Voce já pode dizer eu li na tela da 
                                                                             Eulina