quinta-feira, 27 de junho de 2013

Nunca antes neste país


     Moro numa rua lindeira a um córrego, em cujas margens há um grande espaço coberto de mato e lixo, onde será implantado um "Parque Linear". Há alguns prefeitos atrás, foi iniciada a construção desse parque, o mato foi retirado, foram construidos passeios para caminhadas, instalados aparelhos de ginástica para idosos e brinquedos para crianças;  plantou-se grama e a vizinhança colaborou plantando árvores. Eu plantei dois pés de ipê amarelo... todos nós, moradores da rua, ficamos felizes com a melhoria.
     Porém, o tempo passa, os prefeitos mudam e os subprefeitos também. O mato voltou a crescer. As árvores plantadas morreram ou foram roubadas. Os aparelhos de ginástica e os brinquedos foram depredados. O terreno voltou a ser um matagal com depósitos de entulho e lixo.
     Eu mandei muitos emails para a subprefeitura cobrando providências. Às vezes, três ou quatro meses depois da reclamação, aparecia um caminhão, com um bando de funcionários uniformizados, que após cortarem (mal e porcamente) o mato, se deitavam na rua e tiravam uma soneca. Empilhavam o lixo e o mato cortado e alguns dias depois, passava outro caminhão para recolher o lixo.
     Um de meus vizinhos solicitou a operação cata bagulhos, e no dia marcado, tirou todos os móveis velhos  dos quais queria se desfazer e  os colocou na calçada. Pois lá permaneceram por três dias, nos quais ele telefonava várias vezes, cobrando o serviço.
     Na semana passada, o povo de todo o país resolveu dizer que não aguenta mais pagar tantos impostos em vão.
     Ontem, bem cedinho, oito e meia da manhã, chega um caminhão da prefeitura e estaciona do lado da minha casa. Curiosa, fui ver. O vizinho estava novamente se desfazendo de seus "bagulhos". Fiquei por ali assuntando e ouvi essa conversa:
     - Eu  não tive tempo de colocar tudo na rua, afinal, solicitei o serviço ontem à tarde e vocês já vieram! - e o funcionário uniformizado, com cara de chefe respondeu:
     - É... agora que o povo foi pra rua, se a gente não faz o serviço logo,  apanha...
                                                       Nunca antes neste país!

     Você já pode dizer eu li na tela da
                                                                   Eulina

                               

terça-feira, 25 de junho de 2013

Lágrimas de Pedra


     Quando eu era criança, era chorona. Não tive uma infância fácil. Doenças e desentendimentos na família me faziam chorar todos os dias.
      Meu pai, também abalado pelos problemas, me punha sentadinha no seu colo e  recitava pra mim, o poema I Juca Pirama de Gonçalves Dias:

                                                 Não chores, meu filho,
                                                 Não chores que a vida
                                                 É luta renhida
                                                 Viver é lutar
                                                 A vida é combate
                                                 Que os fracos, abate
                                                 Que os fortes, os bravos
                                                 Só pode exaltar

     Eu ia me acalmando aos poucos e me convencendo de que é importante ser forte, porque a vida é implacável com os fracos. Ouvi tantas vezes esse poema, que decorei. Depois de algum tempo, recitava junto com meu pai e nós nos consolávamos mutuamente.
     Assim, aprendi a ser forte. a não chorar, a agir, procurar soluções.
     Quantas vezes engoli o nó na garganta, sufoquei o soluço no peito e evitei que as lágrimas rolassem...
     Quantas vezes me pus a pensar racionalmente, procurar soluções, trabalhar furiosamente, cantar, dançar, escrever, pintar, viajar, tudo, tudo para não chorar!
     Pensando bem, deu certo. Meu pai morreu. Fiquei sem o meu grande amigo. Apesar de só, apesar de todos os dissabores, não perdi tempo chorando. Fui brava, fui forte, lutei bem a luta renhida. Até agora, aos 70 anos, vida não me abateu.
                                                                      ***
     Mas, meus olhos se revoltaram.
     Eles não puderam se expressar durante todos esses anos. Eles fabricaram lágrimas e elas não rolaram... endureceram e petrificaram.
     Muita gente faz pedras nos rins, outros na vesícula. Eu petrifiquei lágrimas.
     Operei catarata  em abril, no dia 8, o olho direito e no dia 15, o esquerdo. Durante o pós operatório, não se sabe por qual motivo, começaram a aparecer pedras nos meus olhos. Como grãos de areia,  arranhavam, machucavam, eu não podia dormir, porque não podia fechar os olhos. Fui de duas a três vezes por semana ao oftalmo, para me submeter  a sessões de tortura ocular, para extração das pedras. Até meados de maio, o médico extraiu 15!
     O problema com os olhos é que qualquer coisa que se faça, sem anestesia geral, a gente fica vendo! Eu ficava de olho arregalado, inundado de colírio anestésico, porém, vendo o médico empunhar uma pinça e cutucar o olho até tirar a pedra. O fenômeno se chama litíase conjuntival e é raríssimo. O médico que me atendeu só conheceu um caso em mais de 20 anos de profissão!
     E o outro, tinha de ser eu!
     Depois de extraídas as 15 pedras, eu sentia meus olhos inchados. Eu já podia fechar os olhos, mas eles doíam a visão embaçava, a luz me incomodava muito, a cada colírio que o médico receitava, eu me sentia pior, cada vez enxergava menos. Fui ficando apavorada, eu só piorava. Pingava colírios de antes da operação, de depois, de antibiótico, de gel lubrificante, de lágrima postiça, antialérgico e não adiantava. Até que resolvi parar de pingar colírios. Meus olhos incharam mais e ficaram mais doloridos. Fui ao médico e perguntei se não havia algum anti inflamatório via oral, que eu pudesse tomar. E pingar só um colírio descongestionante, tipo Moura Brasil.  Ele falou  "vamos tentar" e receitou o anti .inflamatório.
     Quando tomei o primeiro comprimido, os olhos pararam de doer. E quando pinguei o Moura Brasil, deixei de ter olhos de vampiro. Ufa, que alívio! Pouco a pouco os olhos desincharam e a visão foi melhorando.
     Agora, já estou enxergando bem melhor. Cheguei ao último dia do anti inflamatório. Fui ao oftalmo, ele disse que hoje, eu estou me sentindo como deveria me sentir na primeira semana após a operação. Daqui pra frente, só vai melhorar. Assim eu espero.

                                                                    ***
     Mas daqui por diante, não vou mais ser tão forte. Vou chorar toda vez que tiver vontade.
     Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                    Eulina